Vereador cita passagem bíblica e personagem de cinema, mas não responde sobre nomeação de “irmã afetiva”

Parlamentar não respondeu se é “moralmente” correta a nomeação de uma pessoa com a qual ele tem íntimo laço afetivo. Advogado vê nepotismo.

3370
Foto: Reprodução

A expectativa que o vereador Dhonatan Pagani (PSDB) comentasse sobre a nomeação em cargo comissionado da filha de seu padrasto, Natália Monique da Costa para ocupar a chefia de seu gabinete na Casa de Leis, frustrou. Durante oito minutos e meio ele falou no microfone da tribuna da Câmara de Vereadores de Vilhena, na primeira sessão ordinária de 2021, realizada na manhã desta terça-feira, 2 de fevereiro, mas não tocou no assunto.

O vereador teve a chance de responder se “moralmente” é correta a nomeação de uma pessoa com a qual ele tem íntimo laço afetivo, e divide a mesma moradia.

A contratação caseira foi revelada hoje em reportagem do site Folha do Sul Online, e noticiada pelo Vilhena Notícias.

No discurso, uma espécie de monólogo, Dhonatan Pagani citou uma passagem bíblica do livro de Salmos e frases do personagem fictício de cinema Rocky Balboa, vivido e criado pelo ator Sylvester Stallone.

Nos argumentos religiosos, mas sem direcionar sua fala a alguém em específico, ele disse esperar “que os injustos caiam na própria armadilha”. Em outro trecho do discurso ele citou que “não importa o quanto você bate, mas sim o quanto aguenta apanhar e continuar”. A frase é extraída do filme Rocky Balboa que narra a vida de um humilde lutador de bairro da Filadélfia (Estados Unidos) que ficou mundialmente conhecido.

O discurso completo pode ser assistido na página da Câmara de Vereadores, no Facebook.

RUSGAS COM ADVOGADO

Hoje durante à tarde o advogado Caetano Neto, da Associação de Defesa dos Direitos da Cidadania (ADDC), fez um comentário áspero no confronto do vereador. Numa postagem que fez em uma mídia social Neto chamou o político de pilantra. E disparou: “Caro vereador, sabes o significado do termo ‘afinidade’ relativo a parentesco que consta na Súmula 13 do STF como incidente de nepotismo? Claro que não. Tu és pilantra político associado ao analfabetismo proposital”.

O que diz a Súmula Vinculante 13 do Supremo: a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

A expectativa é que Pagani faça a exoneração da irmã afetiva, ou que ela peça para sair do cargo, para escapar de denúncia no Ministério Público.

AS BANDEIRAS POLÍTICAS DO VEREADOR

Vale salientar que a legislação brasileira não proíbe a nomeação, uma vez que Pagani não tem laços sanguíneos com a “irmã afetiva”. No entanto, o gesto confronta com os discursos dele durante campanha eleitoral.

Dhonatan Pagani foi eleito fazendo críticas ao ‘modus operandi’ da política com um discurso de crítica ao atual cenário político do país, aliado à proposta de renovação da Câmara Municipal. O parlamentar, que já foi lotado em cargo comissionado no gabinete do ex-vereador Rafael Mazeiro na legislatura 2017-2020, sempre disse ser contra à indicação de parentes, ação restringida por lei, e à indicação por critério de amizade ou afetividade para cargos públicos.

Outra bandeira de campanha foi não usar a verba do fundo eleitoral. Ele deu declarações à imprensa e em mídias sociais durante as eleições municipais de 2020 para mobilizar apoiadores à sua candidatura, e com severas críticas às regalias dos políticos, como auxílio moradia e verba indenizatória, benefícios esses legais, mas considerados imorais por Dhonatan Pagani.

Pagani também foi coordenador do Movimento Brasil Livre (MBL) de Rondônia, que condena severamente o nepotismo e o apadrinhamento político.