Ao fazer críticas ao Comitê de Enfrentamento à Covid-19, ACIV cita tratamento que não é mais recomendado pela Saúde

Presidente da ACIV também cita artigo científico da Escola de Saúde Pública de Yale (New Haven, Connecticut - EUA) para defender uso do “kit de profilaxia ou tratamento precoce contra a covid-19”

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Associação Comercial e Empresarial de Vilhena

Ontem à noite o presidente da ACIV – Associação Comercial e Empresarial de Vilhena –, Dirceu Hoffmann, emitiu uma nota à imprensa onde manifesta duras críticas à condução do Comitê de Enfrentamento à Covid-19 de Vilhena. No documento, Hoffmann se posiciona contra a decisão da Prefeitura de Vilhena em seguir o Decreto Estadual que prorroga o ‘toque de recolher’ até sábado, 30 de janeiro, em 29 cidades de Rondônia, e impõe restrições de funcionamento ao comércio.

Hoffmann diz “que não houve nenhuma reunião do Comitê de Enfrentamento à Covid-19 afim de avaliar [o impacto] do Decreto Estadual [nas empresas da cidade]”.

Procurada, a Prefeitura de Vilhena não quis se manifestar sobre as críticas do presidente da ACIV.

O presidente da Associação acusa o Comitê de querer silenciar a ACIV. “Sem comunicação ou debate, foi alterada a composição do Comitê excluindo o membro ativo e combativo [da ACIV] que emitia suas opiniões e críticas fortemente embasadas em dados e pesquisas” e faz uma série de ponderações e questionamentos. Procurada, a Prefeitura de Vilhena não quis se manifestar sobre as críticas do presidente da ACIV.

O documento emitido pela entidade, por exemplo, questiona o Comitê sobre dados que comprovariam que o comércio é o principal agente disseminador do vírus e, ainda, pergunta quantos kits (Ivermectina, Azitromicina, Cloroquina ou Hidroxicloroquina, vitamina D e Zinco) de profilaxia ou tratamento precoce foram distribuídos e a proporção de pacientes que usaram este kit e vieram a desenvolver forma grave da covid-19. Por fim, Hoffmann questiona por qual motivo a Semus – Secretaria Municipal de Saúde – “não adota a nota informativa nº 17/2020- se/gab/se/ms, do Ministério da Saúde (MS), para evitar que os casos de covid-19 evoluam para formas mais graves da doença”.

Baseado na nota informativa do MS, a ACIV diz que diversas instituições, tanto internacionais quanto nacionais, preconizam o uso da cloroquina ou da hidroxicloroquina em pacientes com diagnóstico de covid e indica “que um artigo científico da Escola de Saúde Pública de Yale (New Haven, Connecticut – EUA) concluiu que a hidroxicloroquina deve estar amplamente disponível e distribuída imediatamente para prescrição médica”.

PONTO A PONTO

Ao fazer os questionamentos a ACIV comete equívocos e ignora eventos recentes. A nota técnica do Ministério da Saúde, mencionada pela Associação, foi editada na semana passada e as diretrizes para diagnóstico e tratamento da covid-19 com indicação de uso da cloroquina, hidroxicloroquina e a azitromicina foram suprimidas, devido à inexistência de comprovação científica do uso de tais medicamentos como forma preventiva contra a doença.

As recomendações para uso do kit também estavam disponíveis no aplicativo TrateCOV disponibilizado pelo MS. Na quinta-feira, 21, o Conselho Federal de Medicina (CFM) pediu a retirada imediata do ar do app. Em nota, o conselho diz que identificou diversas inconsistências no aplicativo e a plataforma “induzia à automedicação e à interferência na autonomia dos médicos”.

O aplicativo, que foi retirado do ar ainda na quinta-feira, recomendava o “tratamento precoce” a pacientes com sintomas que podiam, ou não, ser de covid-19. O “tratamento” indicado incluía, mais uma vez, medicamentos sem comprovação como a cloroquina, a hidroxicloroquina e a azitromicina.

O Conselho Nacional de Saúde (CNS) também encaminhou ofício ao Ministério da Saúde pedindo a revogação de qualquer instrumento (nota técnica, nota informativa, orientações, protocolos ou ofícios) que incentive o uso de medicamentos para covid-19, sem eficácia e seguranças comprovadas e aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

A própria Anvisa quando realizou reunião para a liberação da vacina Oxford/AstraZeneca/Fiocruz e os da Coronavac/Butantan pontuou de forma veemente que não existe, até o momento, medicação preventiva ou tratamento precoce contra a covid-19.

Nesta semana o Tribunal de Contas da União (TCU) pediu explicações ao Ministério da Saúde.  O TCU deu prazo de 10 dias para que o governo envie ao órgão uma série de informações sobre o aplicativo TrateCOV, que recomendava o uso de medicamentos sem eficácia para o chamado “tratamento precoce”.

Desde o início da pandemia de coronavírus, o país já gastou R$ 90 milhões com a compra de cloroquina, ivermectina e outros medicamentos sem comprovação científica para o tratamento da covid, e outros R$ 250 milhões para distribuir o chamado “kit covid” por meio do programa Farmácia Popular. Esse valor daria para comprar 13 milhões de doses de vacina de Oxford produzida pela AstraZeneca.

Em relação ao artigo científico da Escola de Saúde Pública de Yale (New Haven, Connecticut – EUA) publicado na revista The Lancet em 22 de maio de 2020, usado até a última sexta-feira pelo Ministério da Saúde para defender o uso do “kit de profilaxia ou tratamento precoce contra a covid-19”, e citado por Dirceu Hoffmann nas críticas que fez ao Comitê de Enfrentamento à Covid-19, a própria Universidade de Yale se manifestou sobre o assunto e admitiu, meses depois, a ineficácia da hidroxicloroquina no tratamento contra a covid.